João Pedro Lamana Paiva
Registrador de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre
Introdução
O Sistema Registral brasileiro é de natureza MISTA, podendo ser:
CONSTITUTIVO: cria um direito e gera a ficção de conhecimento para o Brasil e o Mundo. É Constitutivo em relação aos atos de oneração e às transmissões inter vivos
DECLARATIVO: limita-se a declarar a existência de um direito preexistente. É Declaratório também nas aquisições originárias e causa mortis, bem como nos títulos de divisão, judiciais ou extrajudiciais
Os sistemas de registros servem para criar, modificar, declarar e extinguir direitos no plano da normalidade da vida em sociedade. Assim como o juiz atua visando restabelecer a ordem quando rompida, criando, modificando, extinguindo e declarando direitos, o registrador e os demais agentes/órgãos de registros atuam na vida normal da sociedade com os mesmos propósitos.
Segurança jurídica do sistema
O Sistema Registral Brasileiro admitiu a presunção RELATIVA (juris tantum) de verdade ao ato registral, o qual, até prova em contrário, atribui eficácia jurídica e validade perante terceiros (art. 252 da Lei 6.015/73 e art. 1.245 e seguintes do Código Civil).
O registro de imóveis
Medel, ao conceituar o registro de propriedade, prescreve que:
O Registro da propriedade é aquele serviço de caráter essencial e jurídico, que tem por finalidade a publicidade de terminadas situações jurídicas, por meio da inscrição, obrigatória ou constitutiva, dos direitos reais, como regra geral, sobre imóveis, em atenção à segurança jurídica do tráfego imobiliário, da qual é destinatária a própria sociedade, uma vez que satisfaz o interesse particular dos indivíduos, estando a cargo de alguns funcionários públicos, técnicos em Direito, com faculdades de índole jurisprudencial para fins, por meio da qualificação, da justiça registral.[1]
[1]MONTES, Angel Cristóbal. Direito Imobiliário Registral. Tradução de Francisco Tost. Porto Alegre: IRIB: Sergio Antônio Fabris, 2005, p. 167.
O registro de imóveis
Para falar em segurança jurídica no tráfego imobiliário é necessário também mencionar o instrumento utilizado para desempenhar tal encargo: a publicidade. Dar publicidade no sentido técnico jurídico significa tornar cognoscível a todos determinada situação jurídica para tutelas dos direitos; é o revés da clandestinidade.
A publicação é essencial instrumento para prevenir fraudes e a boa-fé de terceiros, evitando as transmissões fraudulentas e assegurando ao proprietário do imóvel, as vantagens econômicas derivadas da certeza do domínio.
Não se pode perder de vista que, tornando pública a situação jurídica dos imóveis, os órgãos registrais fornecem àquelas situações dominiais aparentes segurança de que os dados que constam nestes órgãos coincidem com a realidade.
O Sistema Brasileiro atribui à publicidade registral efeito erga omnes, justamente pelo fato da presunção de que todos têm conhecimento da relação jurídica uma vez que esta relação jurídica ingressa no Registro Imobiliário.[1] .
[1] RICHTER, Luiz Egon. Princípio de Inscrição: considerações gerais. In: Revista de Direito Imobiliário, n. 318, ano 27, Set./ Out. de 2004, .p. 4.
O registro de imóveis
O terceiro adquirente procura na instituição registral a eliminação dos riscos, no que diz respeito à verdadeira situação jurídica das propriedades territoriais.
O sistema da Lei nº 6.015/73
A Lei 6.015, desde sua vigência a partir de 1976, instituiu o sistema de matrícula (fólio real) para os imóveis em todo o país, abandonando o sistema de inscrições e transcrições vigente até então.
A matrícula imobiliária
A matriculação dos imóveis fez com que o sistema registral imobiliário brasileiro fosse modernizado já que origina um histórico completo relativo aos imóveis, formando um verdadeiro “curriculum vitae” de cada unidade imobiliária.
POR FALAR EM MATRÍCULA, NO RIO GRANDE DO SUL HÁ A POSSIBILIDADE DE SE FAZER CONSTAR O DESENHO GRÁFICO DO IMÓVEL NO FÓLIO REAL, como podemos observar na ilustração abaixo:
Princípio da Concentração – Um novo princípio formador
do Direito Registral Imobiliário brasileiro
A concentração e os demais princípios:
– PUBLICIDADE (FICÇÃO DE CONHECIMENTO);
– INSCRIÇÃO;
– PRIORIDADE;
– CONCENTRAÇÃO
• Princípio da publicidade
Uma vez realizado o ato registral, ele se torna público, a fim de permitir a oponibilidade do direito inscrito perante toda a sociedade. O que não tem publicidade, não gera oponibilidade, pois, se o ato não é conhecido, não tem como ser respeitado.
O meio de publicizar os atos registrais é a certidão, a qual pode ser de inteiro teor, em resumo ou em relatório.
DISPOSITIVOS LEGAIS:
Art. 16 e seguintes da LRP.
• Princípio da inscrição
Também chamado de princípio da obrigatoriedade, impõe o lançamento dos atos sujeitos a registro e/ou averbação no livro próprio, como corolário da eficácia jurídica, tendo por finalidade dar aos atos segurança e oponibilidade perante terceiros. É a aplicação da máxima popular: “Quem não registra não é dono”.
DISPOSITIVOS LEGAIS:
Art. 1.245 e parágrafos do Código Civil.
Art. 167, I e II; arts. 168 e 169 da Lei nº 6.015/73.
• Princípio da prioridade
Confere ao primeiro que apresentar o título para registro/averbação, a preferência na realização do ato e, assim, a prioridade do direito real oponível erga omnes. Vale aqui a máxima: “O Direito não socorre aos que dormem”.
O lançamento do título no Livro Protocolo, com a aquisição do número de ordem, determina a precedência do direito real.
DISPOSITIVOS LEGAIS:
Art. 174 e art. 182 ao 186 da Lei nº 6.015/73;
• Princípio da concentração
Esse princípio significa que se deve trazer para a matrícula tudo o quanto se referir ao imóvel, para que haja uma publicidade ampla e de conhecimento de todos, preservando e garantindo, com isso, os interesses do adquirente e de terceiros de boa-fé.
DISPOSITIVOS LEGAIS:
Artigos 167, II, item 5, combinado com o art. 246 da LRP.
O registro de imóveis e o princípio da concentração
A doutrina afirma comumente que a função primordial do sistema registral é a de dar segurança jurídica ao tráfego imobiliário.
Origem doutrinária do princípio
O denominado “princípio da concentração” surgiu na doutrina registral imobiliária como construção resultante dos estudos realizados por Décio Antônio Erpen (Desembargador aposentado do TJRS) e João Pedro Lamana Paiva (Registrador Imobiliário no RS), com a adesão do Registrador de Imóveis gaúcho Mario Pazutti Mezzari.
No Brasil, já no ano de 2000, por ocasião do XXVII Encontro de Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, em Vitória (ES), foi apresentado o trabalho “A autonomia registral e o princípio da concentração”, publicado posteriormente no livro Registro de imóveis; estudos de direito registral imobiliário, edição de Sérgio Fabris Editor, em 2002, sob a coordenação de Sérgio Jacomino (do Instituto do Registro Imobiliário do Brasil – IRIB).
• O princípio no exterior
No exterior, foi apresentado pioneiramente, por seus idealizadores, quando da realização da 2ª Jornada Ibero-americana de Direito Registral, ocorrida em Havana (Cuba), no ano de 2001, onde recebeu atenção especial entre as conclusões daquele conclave.
O tema do princípio da concentração mereceu destaque na Relatoria final da Jornada Ibero-americana de Havana, onde se fez consignar a seguinte passagem:
“Estudiar la propuesta del Delegado Brasileño con relación al principio de la Concentración de los Actos Administrativos y Judiciales de manera estén contenidos en el Folio Real a fin de poseer una verdadera historia de la finca.”
• Desenvolvimento do princípio
Em 2004, sob a forma de um artigo intitulado “Princípio do registro imobiliário formal”, foi desenvolvido no livro “Introdução ao Direito Notarial e Registral”, também publicado pela editora Sérgio Fabris de Porto Alegre.
Posteriormente a isso, sua divulgação tem sido ampla em artigos de doutrina, conferências, palestras e aulas em cursos de Direito Notarial e Registral, fazendo com que, pela consistência de suas idéias inspiradoras, passasse a ser disseminado no meio jurídico em todo o país.
Referências na doutrina
Na atualidade, o princípio da concentração já é referido amplamente na doutrina brasileira de Direito Registral e Imobiliário podendo ser citados, dentre outros autores:
MEZZARI, Mario Pazutti. União estável; questões instrumentais e registrárias, p.3, disponível em http://www.colegioregistralrs.org.br/doutrinas/.
PASSARELI, Luciano Lopes. O princípio da boa-fé registral: necessidade de sua adoção para as incorporações e loteamentos. Monografia que recebeu distinção no II Prêmio Abecip de Monografia em Crédito Imobiliário e Poupança, (http://www.arpenbrasil.org.br/).
Referências na doutrina
PASSOS, Tatiana. Registro de imóveis para profissionais do direito. 2.ª ed. Editora Russel, 2008. p.404.
MELO, Marcelo Augusto Santana. – com outros autores. Registro de Imóveis e Meio Ambiente. (Série direito registral e notarial/coordenação Sérgio Jacomino) Saraiva, 2010. p.38.
STIFELMAN, Anelise Grehs. O registro de imóveis e a tutela do meio ambiente. Disponível em http://www.colegioregistralrs.org.br/doutrinas/AneliseGrehsStifelmano_RITutelaMeioAmbiente.pdf
• O princípio na jurisprudência
Já começam a surgir julgados, especialmente no TJRS, reconhecendo a aplicação do princípio da concentração registral:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AVERBAÇÃO DE DEMANDA JUDICIAL PENDENTE. É medida que visa dar publicidade, respaldada no princípio da concentração que empresta eficácia aos registros contidos na matricula do imóvel. AGRAVO NEGADO. (Agravo de Instrumento Nº 70006893515, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 11/11/2003).
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TESTAMENTO. AVERBAÇÃO DA LIDE NO REGISTRO IMOBILIÁRIO DE DEMANDA JUDICIAL PENDENTE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA (ART. 273 CPC). AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTOS. INDEFERIMENTO. Admite-se a averbação da lide no registro imobiliário, visando dar publicidade, respaldada no principio da concentração que empresta eficácia aos registros contidos na matrícula do imóvel. A presença da verossimilhança da alegação, atestada por prova inequívoca, e o receio de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I, do CPC) são pressupostos que devem estar presentes para a concessão de tutela antecipada. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70030685432, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 30/09/2009).
• Visão do TRF da 4ª Região
Em um documento intitulado “Meio Ambiente, reserva legal e o princípio da publicidade”, elaborado como texto-base para o Seminário sobre Georreferenciamento e o Registro de Imóveis, promovido pelo IRIB, em 2004, o TRF/4, mesmo reconhecendo que sua jurisprudência não admite, em muitas situações, a plenitude do princípio da concentração, faz referência à essência desse instituto de Direito Registral e reconhece sua importância, propugnando pelo alargamento da visão sobre as novas funções dos registradores na atualidade.
• Inserção do princípio na CNNR-RS
Conforme reconhece Mário Mezzari (op. cit. p. 3), o princípio da concentração também foi inserido na Consolidação Normativa Notarial e Registral da Corregedoria-Geral de Justiça do RS, ainda que não citado expressamente no rol de princípios de seu art. 315, por ter, em seu contexto, “admitido como averbáveis várias situações jurídicas que a doutrina clássica negava acesso ao registro imobiliário”.
NOÇÃO, FUNDAMENTO E ALCANCE
• Noção
O princípio da publicidade apregoa que o conhecimento amplo dado ao ato registral, tão logo ele seja editado, faz com que se torne oponível aos interesses das demais pessoas, materializando-se através da respectiva certidão.
O princípio da concentração é um corolário importante do princípio da publicidade porque vai definir qual o conteúdo de atos registrais passíveis de figurarem na matrícula do imóvel de modo que possam ser publicizados e opostos a terceiros a partir da respectiva certidão.
PUBLICIDADE X CLANDESTINIDADE
O direito só protege aquilo a que é dado conhecer.
O conhecimento público se dá através dos órgãos de registros públicos, que incluem outros além do Registro de Imóveis, porque quando a sociedade compreender a importância dos registros passará a dar mais importância ao Registro de Imóveis.
SÚMULA 375 do STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má fé do terceiro adquirente”.
• Fundamento
O princípio da concentração fundamenta-se em que a matrícula (fólio real ou álbum imobiliário) deve ser tão completa de informações quanto possível, de forma que dispense diligências a outras fontes de informação relativas ao imóvel, fazendo com que essa fonte única de informação seja sinônimo de segurança jurídica.
• Conflito originador do princípio
Esse princípio nasceu a partir da discussão doutrinária acerca de serem ou não exaustivos, os atos e títulos passíveis de registro/averbação enumerados no art. 167 da Lei dos Registros Públicos (Lei nº 6.015/73), relativamente às hipóteses registrais que admitem ingresso no álbum imobiliário.
• Alcance do princípio
Assim, nenhum fato jurígeno ou ato jurídico que diga respeito à situação jurídica do imóvel ou às mutações subjetivas que possa vir a sofrer podem ficar indiferentes ao registro/averbação na matrícula.
Dos atos a incluir na matrícula
Dessa forma, devem ser incluídos na matrícula imobiliária para que esta cumpra sua finalidade de repositório único de informações sobre o imóvel:
Os atos translativos da propriedade;
As instituições de direitos reais;
Os atos judiciais e administrativos;
Os atos de outra natureza que digam respeito à situação jurídica em que o imóvel se encontra.
• Dos atos em espécie (passíveis de lançamento na matrícula)
• Os atos judiciais que restringem a propriedade;
• Os atos judiciais constritivos (penhoras, arrestos, seqüestros, embargos), ainda que acautelatórios);
• As declarações judiciais de indisponibilidade;
• As ações pessoais reipersecutórias e as reais;
• Os decretos de utilidade pública;
• As imissões nas expropriações;
• Os decretos de falência;
• Os tombamentos;
• Os comodatos;
• As servidões administrativas;
• Os protestos contra a alienação de bens;
• Os arrendamentos e as parcerias.
• TENDÊNCIA DE AMPLIAÇÃO
Situações da legislação já existente
Muitas situações previstas na legislação extravagante, já existente em matéria de registros públicos, têm feito com que se firme cada vez mais o princípio da concentração e se amplie a razoabilidade da idéia de que a concentração na matrícula é a melhor forma de se obter informação rápida e precisa sobre o imóvel.
• Algumas situações concretas
Alguns exemplos de que as situações previstas no art. 167 da LRP não constituem rol exaustivo:
Transferência ou caução do direito de participação sobre a lavra pelo proprietário da terra minerada (art. 12 do Decreto-Lei nº 227/67) só oponível contra terceiros depois da inscrição no RI;
Emissão de debêntures pela S.A. (art. 98, § 2º da Lei nº 6.404/76) condicionada ao registro da escritura de emissão no RI de sua sede;
O gravame de perpetuidade de florestas (art. 21, § 1º da Lei nº 9.985/2000) por termo de compromisso perante o órgão ambiental, averbado no RI.
• Ampliação do princípio
O surgimento de novas leis, que espelham o aspecto cada vez mais dinâmico e complexo da sociedade moderna, põem em relevo outras tantas situações que passam a exigir o lançamento das respectivas informações na matrícula do imóvel enquanto fonte única de publicidade a seu respeito e como sinônimo de certeza na obtenção de segurança jurídica em relação à propriedade imobiliária e aos negócios que envolve.
• Outras situações atuais
Cresce o número de situações cujo mais adequado meio de publicidade é sua inserção na matrícula ressaltando a importância do princípio da concentração, tais como:
O confisco de áreas utilizadas para o cultivo de plantas psicotrópicas, por sentenças criminais;
As questões ambientais que têm gerado necessidade de obter informação adequada: o registro dos passivos ambientais criados sobre os imóveis (aterros sanitários, aterros industriais, áreas contaminadas), assim como os inventários de áreas de preservação permanente, de reserva florestal legal, de florestas plantadas, de recursos hídricos existentes e a instituição de reservas ambientais públicas e privadas, bem como os termos de ajustamentos de condutas celebrados entre o Ministério Público e as Pessoas Naturais e/ou Jurídicas.
• A questão legislativa
Francisco José Rezende dos Santos (O princípio da concentração no registro de imóveis, in Revista do SFI nº 33, ABECIP:2011, p. 40) julga importante o princípio da concentração asseverando que este consiste em que os fatos que possam produzir efeitos no imóvel, em relação a seus proprietários ou ao registro, devem ser lançados na matrícula sob pena de não serem levados em consideração pelo mundo jurídico.
Entretanto falta dar dimensão a tal ato de obrigatoriedade e certeza jurídica para que seja absoluto e imperativo. Considera que isso só será possível a partir do momento em que se edite uma modificação legislativa que reconheça, com força cogente, que os negócios jurídicos celebrados com base em informações advindas do Registro Imobiliário estejam protegidos pelo princípio da boa-fé, de modo a atestar, suficientemente, tanto a titularidade da propriedade quanto os ônus, encargos ou gravames incidentes sobre o imóvel, promovendo, igualmente, redução de custos aos negócios imobiliários com a eliminação de certidões e documentos atualmente exigidos.
• O Projeto de Lei nº 5.951/2009
O princípio da concentração é tão importante e já está de tal forma consagrado no âmbito do Direito Registral Imobiliário que a legislação registral está sendo objeto de alterações profundas no sentido de explicitar sua importância e aplicação.
Essa realidade é espelhada pelo que se contém no Projeto de Lei nº 5.951/2009, em tramitação na Câmara dos Deputados, aguardando manifestação do Senado Federal, desde 09/04/2010.
Tal projeto, pela primeira vez no direito brasileiro, refere a adoção de princípios de direito registral imobiliário, inserindo-os no texto da Lei nº 6.015/73.
O princípio da concentração e a segurança jurídica
Assim, o aperfeiçoamento da legislação registral provocará uma ampliação da força do princípio da concentração.
Se a lei vier a estabelecer uma presunção absoluta de conhecimento por parte de terceiros quanto aos direitos inseridos na matrícula, a força probatória da certidão de matrícula será bastante aumentada.
Essa auto-suficiência da matrícula significará ampliação de segurança jurídica aos negócios imobiliários.
• Polêmica sobre a necessidade de apresentação das certidões de feitos ajuizados
Escrituras públicas, certidões e princípio da concentração
– Um dos assuntos tormentosos no âmbito das atividades notariais e registrais, por sua importância tanto para os Tabeliães como para os Registradores Imobiliários e pela diversidade de entendimentos, diz respeito à apresentação das certidões de ônus reais e de feitos ajuizados para a realização de negócios jurídicos translativos da propriedade imobiliária e a possibilidade de sua dispensa pelas partes contratantes.
– Entretanto, na atualidade, em razão do processo interpretativo das normas cogentes e da evolução doutrinária do princípio da concentração, está-se procurando estabelecer um amplo consenso entre os registradores e notários brasileiros e, dada a sua grande importância, o referido tema não poderia deixar de ser tratado no âmbito desta abordagem.
– Há que se considerar, também, que o princípio da concentração, como princípio jurídico em franca evolução doutrinária no âmbito do Direito Registral tendo influenciado fortemente, nos últimos tempos, a formação da legislação de regência da atividade registral do país, ampliando e detalhando o elenco de atos passíveis de consignação na matrícula imobiliária, proporcionando, assim, que seja proporcionado aos credores os mais eficazes meios de proporcionar publicidade erga omnes acerca dos fatos e atos que afetem um imóvel de seu interesse.
– Em decorrência disso, o alcance do conteúdo das certidões passíveis de expedição pelo Registro de Imóveis (notadamente as de matrícula, as de ônus reais e as de ações reais e pessoais reipersecutórias) tem-se ampliado à medida que evolui o princípio.
• ESCRITURAS PÚBLICAS E CERTIDÕES
A Lei nº 7.433/85 regula quais são os documentos exigíveis para a lavratura de atos notariais relativos a imóveis e a regulamentação específica (Decreto nº 93.240/86) ganhando relevo nessa questão duas espécies de certidões:
• A certidão de ações reais e pessoais reipersecutórias e ônus reais, expedidas pelos Registros Imobiliários;
• A certidão de feitos ajuizados, expedidas pelos distribuidores judiciais ou pelos registros de distribuição extrajudiciais, quando existentes na localidade.
• A problemática das certidões de feitos ajuizados
Entretanto, há um sem-número de procedimentos decorrentes da interpretação dada à legislação pertinente, que estabelece a necessidade de apresentação de certidões de feitos ajuizados para a lavratura de escrituras públicas relativas a imóveis, nos termos da Lei nº 7.433/85 e sua regulamentação pelo Decreto nº 93.240/86.
Podemos examinar os principais posicionamentos:
• Posição 1: valor absoluto das certidões
Há quem considere que a segurança jurídica passa pela exigência das certidões (ou seja, dar um cumprimento estrito e literal às disposições contidas na legislação específica) como é o caso do posicionamento defendido por Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza (Boletim Eletrônico do Irib nº 2851);
• Posição 2: valor relativo das certidões
Há aqueles que atribuem um valor relativo a essas certidões, considerando-as não de todo despropositadas no âmbito dos negócios imobiliários, mas desprovidas de uma importância fundamental no sistema como é o caso do posicionamento de Sérgio Jacomino (Boletim Eletrônico do Irib nº 2834);
• Posição 3: dispensa total das certidões
Há aqueles que entendem ser, as certidões de feitos ajuizados previstas na Lei nº 7.433/85, totalmente dispensáveis, como foi o caso de ter sido inserida essa dispensa no subitem 16.2.8.1 do Código de Normas da CGJ do Estado do Paraná, editado em 2005, o qual foi objeto de Mandado de Segurança com concessão de liminar suspendendo os efeitos da referida disposição, dando lugar a uma longa discussão jurídica e terminando por ser revogado pela edição de um novo provimento no ano de 2008.
• Posição 4: adoção de norma própria para adequação
Há quem adote procedimento diverso, não dispensando totalmente a providência, mas estabeleça normas específicas não necessariamente coincidentes com o previsto na Lei e no Decreto, como é o caso da Instrução nº 192/1990 da CGJ do Estado de Minas Gerais, que considera inútil a juntada de qualquer certidão de feitos ajuizados que não diga respeito a ação de direito real ou pessoal sobre o imóvel, mandando juntar certidão em relatório (passada pelo escrivão) esclarecendo o objeto da ação e a situação do processo, na hipótese de constar a existência da ação na certidão de transcrição anterior ou na certidão de ações reais e pessoais reipersecutórias e de ônus reais passadas pelo Registro de Imóveis.
• Posição 5: dispensa das certidões pelas partes
Há, também, quem adote a possibilidade de que tais certidões venham a ser expressamente dispensadas pelas partes, desde que esse fato seja consignado na escritura, bem como seja consignado o alerta do Notário, às partes, acerca dos riscos inerentes a essa dispensa, como é o caso da orientação traçada através de Nota Conjunta pelos Colégios Notarial e Registral do Rio Grande do Sul, editada no ano de 2011.
• Posição 6: dispensa das certidões pelos Bancos
Há quem acrescente a essa problemática, também, a ilegalidade da dispensa das certidões de feitos ajuizados pelos Bancos que financiam imóveis e, por lei, podem celebrar negócios imobiliários por instrumento particular com força de escritura pública, os quais também deveriam observar o procedimento legal de juntada das certidões aos contratos, como defende Paulo Roberto Mattos Xavier da Silva (Revista Fé Pública, ano II, nº 15, p. 46).
• Posição 7: exigência das certidões pelo registrador
Há, por fim, aqueles que, em decorrência do indicado no item anterior, entendem que o registrador imobiliário deve exigir dos Bancos a juntada das certidões previstas em lei, por ocasião do pedido de registro dos contratos bancários, sob pena de negar-lhes registro e os decorrentes efeitos reais, fazendo com que o problema da juntada de certidões, que até então envolvia apenas a atuação do Tabelião migre para as mãos do Registrador Imobiliário, como defende Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza (Certidões de feitos ajuizados devem ser anexadas ao instrumento particular previsto na lei 4.380, disponível no site www.anoreg.org.br).
• Sobre o conteúdo das Certidões de Ônus
Por outro lado, Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza (IRIB em Revista, nº 315, mar./abr. 2004, p. 76) após asseverar que não é tranqüila a conceituação de ônus reais e invocando lição de Jether Sottano, apresenta a definição de ônus real como sendo “todo gravame que inserido à coisa restringe o domínio ou direito de propriedade”, terminando por afirmar, em relação ao conteúdo das certidões de ônus reais, que este corresponde ao que vem sendo apregoado para a especificação de todos os atos que deveriam estar especificados no art. 167 da Lei 6.015 (cuja redação, entretanto, continua experimentando aperfeiçoamentos através de iniciativas tais como o Projeto de Lei nº 5.951/2009, aprovado pela CCJC da Câmara dos Deputados e enviado ao Senado).
• Conteúdo das certidões de Ônus Reais
Isso demonstra perfeita harmonização do tema relativo às certidões de ônus com a concretização do princípio da concentração.
Assim, o referido autor apregoa que as Certidões de Ônus devem referir: os direitos reais que onerem a coisa, listados no art. 1.225 do Código Civil (superfície, servidões, usufruto, uso, habitação, promessas de compra-e-venda, hipoteca, anticrese); a instituição de bem de família; os contratos de locação registrados nos quais haja cláusula de vigência…
• Certidões de Ações X Certidões de Feitos
O ponto nodal dessa controvertida questão está, entretanto, em que a Lei 7.433/85 (§ 2º do art. 1º) refere-se a “certidões de feitos ajuizados” e a respectiva regulamentação (Decreto nº 93.240/86, art. 1º, IV) faz referência às “certidões de ações reais e pessoais reipersecutórias” (além das de ônus reais). Quanto às de ônus reais, não resta qualquer dúvida de que são elas, há muito tempo, expedidas pelo Registro de Imóveis. Restou dúvida, no entanto, quanto a se a certidão de feitos ajuizados é aquela de natureza estritamente judicial, assim denominada e relativa a processos cíveis e/ou criminais, fornecidas pelos Distribuidores Judiciais nos mais diversos âmbitos de nossa organização judicial/extrajudicial ou se, por ser específica para prova relativa a negócios imobiliários e, por conter informações relativas às ações judiciais que envolvem o imóvel, é a mesma certidão que a norma regulamentar designa como “certidão de ações reais e pessoais reipersecutórias” fornecida pelo Registro de Imóveis.
• Escrituras Públicas e Certidões
Tanto é assim que Valdecy Gusmão (A exigência da apresentação das certidões de feitos ajuizados por ocasião da lavratura de escrituras públicas de alienação de imóveis em face do princípio da concentração. Recife, 2011), em grande esforço de integração interpretativa, traça toda uma coerente argumentação no sentido de que as certidões de feitos ajuizados referidas pela Lei nº 7.433/85 são aquelas obtidas no Registro Imobiliário da circunscrição onde esteja localizado o imóvel objeto do negócio translativo da propriedade imobiliária a ser celebrado mediante escritura pública.
Nesse aspecto concordamos com o posicionamento do ilustre titular do 3º Ofício Imobiliário da capital pernambucana, em razão, especialmente, da grande evolução experimentada pelo princípio da concentração, que terminou por acolher, na matrícula, as informações relativas aos feitos ajuizados em relação ao imóvel objeto do negócio. Essa parece ser a visão mais coerente e atualizada sobre essa problemática.
É ainda conveniente lembrar que a apresentação das certidões de ônus reais e de ações reais e pessoais reipersecutórias tem caráter obrigatório, restando ao adquirente dispensar tão-somente a apresentação de certidões de natureza fiscal, por força do que dispõe o § 2º do art. 1º do Decreto nº 93.240/86, respondendo, aquele, em contrapartida, por eventuais débitos fiscais anteriormente inadimplidos.
• Das dificuldades
Há um embaraço ao tráfego imobiliário decorrente da peregrinação em busca de certidões que não têm importância significativa em relação à segurança do negócio imobiliário.
Há interpretações que vão desde o entendimento de que é obrigatória apresentação de tais certidões relativas aos juízos cíveis, das justiças estadual e federal, obtidas no domicílio dos alienantes e na circunscrição onde está situado o imóvel, até o entendimento de que aquelas podem ser dispensadas.
A necessidade de apresentação de certidão de feitos ajuizados por ocasião da lavratura de escrituras públicas relativas à alienação de imóveis constitui uma questão tormentosa.
• Consequências do princípio da concentração
A matrícula deve ser tão completa de informações quanto possível, dispensando diligências a outras fontes de informação relativas ao imóvel, fazendo com que essa fonte única de informação seja sinônimo de segurança jurídica.
Assim, é de se defender que o princípio da concentração, que reconhece no Registro de Imóveis a força atrativa de todos os fatos relevantes aos bens imóveis aponta no sentido de que absolutamente nada, relativo ao imóvel, deve ficar alheio à indicação na matrícula.
Dessa forma, à luz do princípio da concentração defendemos que as certidões que devem ser exigidas para a lavratura de escrituras públicas, no que se refere aos imóveis, devem ser obtidas junto às respectivas serventias de registro imobiliário.
• Das exigências legais
A Lei 7.433/85, por meio do seu artigo 1º, prescreve que “Na lavratura de atos notariais, inclusive os relativos a imóveis, além dos documentos de identificação das partes, somente serão apresentados os documentos expressamente determinados nesta Lei”.
O § 2º do referido artigo prescreve que “O Tabelião consignará no ato notarial, a apresentação do documento comprobatório do pagamento do Imposto de Transmissão inter vivos, as certidões fiscais, FEITOS AJUIZADOS, e ônus reais, ficando dispensada sua transcrição”.
Conclusão 1 : EXISTE A EXIGÊNCIA LEGAL DA APRESENTAÇÃO DA CERTIDÃO DE FEITOS AJUIZADOS;
• Das exigências legais
Decreto nº 93.240/86, encontramos o inciso IV do Art. 1º, o qual prescreve que “Para a lavratura de atos notariais, relativos a imóveis, serão apresentados” …”a certidão de ações reais e pessoais reipersecutórias, relativas ao imóvel, e a de ônus reais, EXPEDIDAS pelo Registro de Imóveis competente, cujo prazo de validade, para este fim, será de 30 (trinta) dias”
Conclusão 2 : O TERMO “EXPEDIDAS” INDICA QUE A NORMA REGULAMENTADORA DA LEI 7.433/85 EXPLICITAMENTE ESTABELECE QUE AS CERTIDÕES DEVEM SER OBTIDAS JUNTO AO REGISTRO DE IMÓVEIS COMPETENTE.
• Conclusão
TAL ENTENDIMENTO TEM COMO CONSEQUÊNCIA A MAIOR PRATICIDADE PARA A LAVRATURA DE ESCRITURAS PÚBLICAS, A VALORIZAÇÃO DA FUNÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO E MAIOR SEGURANÇA JURÍDICA AOS NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS.
DESSA FORMA, O POSICIONAMENTO EM RELAÇÃO AO QUAL QUEREMOS CONTAR COM A ANUÊNCIA DOS COLEGAS, É O DE QUE OS FEITOS AJUIZADOS DEVEM CONSTAR NECESSARIAMENTE NA MATRÍCULA IMOBILIÁRIA, POR REGISTRO/AVERBAÇÃO, PARA QUE SEJAM RECONHECIDOS COMO VÁLIDOS E EFICAZES, RATIFICANDO, NESSE SENTIDO, O PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO.
A SORTE ESTÁ LANÇADA!…
PELO PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO E PELAS LEIS E REGULAMENTOS APLICÁVEIS, PODEMOS AFIRMAR QUE EXISTE A PREVISÃO DA APRESENTAÇÃO DA CERTIDÃO DE FEITOS AJUIZADOS, A QUAL DEVE SER OBTIDA JUNTO À SERVENTIA DE REGISTRO IMOBILIÁRIO COMPETENTE, NÃO PODENDO SER DISPENSADA.
• Modelo de certidão proposta
C E R T I D Ã O N E G A T I V A
CERTIFICO, a pedido verbal de parte interessada, que, de acordo com os livros deste serviço registral, desde o dia de sua instalação em 5 de julho de 1865, até a presente data, inexistem AÇÕES REAIS ou PESSOAIS REIPERSECUTÓRIAS, HIPOTECAS, FEITOS AJUIZADOS ou outros ÔNUS legais ou convencionais, registrados e/ou averbados, gravando o imóvel de propriedade de FULANO DE TAL, casado, relativo a (o): LOTE URBANO sob o número doze (12) da quadra “A” da planta do loteamento “Vila Silva”, situado na Rua Mariano, nesta cidade, o qual se encontra devidamente matriculado nesta serventia sob o número 23.000, objeto do R-1/23.000 do Livro 2 – Registro Geral.
O referido é verdade e dou fé.
Porto Alegre, 5 de julho de 2012
Registrador e/ou Substituto_______________________
Emolumentos: Certidão Matrícula 23.000 – 1 página: R$5,10 (0314.00.1100008.05159 = R$0,20)
Busca em livros e arquivos: R$5,30 (0314.00.1100008.05159 = R$0,20)
Processamento eletrônico de dados: R$2,70 (0314.00.1100008.05159 = R$0,20)
• A consagração do princípio da concentração
Como podemos ver, nada, absolutamente nada, relativo ao imóvel, deve ficar alheio à indicação na matrícula: esse é o princípio da concentração, que reconhece no Registro de Imóveis a força atrativa de todos os fatos relevantes aos bens imóveis, servindo como um ímã aos títulos que interessam juridicamente à sociedade.
Porto Alegre, junho de 2012.
João Pedro Lamana Paiva
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